O Último a Sair



Em poucos dias duas notícias desastrosas no meio fashion: Raf Simons abandona a direcção criativa da Dior e Alber Elbaz sai da Lanvin. Após temporadas a recriar os estilos das duas grandes casas parisienses saem sem se fazer anunciar, assim de surpresa. Ninguém estava saturado das suas criações, aparentemente não fizeram nenhum disparate pessoal ou profissional. Raf, supostamente, por vontade própria, Alber por decisão da empresa.

As palavras de Alber Elbaz, dirigidas à comunicação social, caem como uma bomba e servem para colocar os media e o público completamente a seu lado, após 14 anos de trabalho para a Lanvin. Porque nos sentimos tão chocados com estas notícias? É quase tão ridículo como os adeptos ferrenhos que vivem a 100% as conquistas e derrotas do seu clube, tal como todos os fait de vaire inerentes a esse ambiente futebolístico... No fundo conseguimos, com base no gosto e experiências pessoais, perceber o êxito de uma marca e se esta consegue equilibrar inovação/novidade com tradição/herança. Isso faz-nos ter preferências ou simplesmente dar valor a determinada casa de Moda ou designer. Hoje a novidade sobrepõe-se à herança, à arte. Mas é uma novidade postiça, copiada, replicada. É novidade apenas devido ao seu conteúdo volátil. Tentamos lutar contra este consumo rápido mas a verdade é que parece um beco sem saída. É difícil termos orçamento para gastar em grandes designers, mesmo que adorássemos comprar todo o nosso guarda roupa na Dior ou na Lanvin. Acredito que, embora exista público para a hight fashion, estejamos a atravessar uma crise gigante de valores, mais que financeira. Para além da falta de capital para investirmos nestes artigos de autor também está demasiado presente a vontade de consumir em quantidade, copiar os nossos pares e certificarmo-nos que a nível das aparências não ficamos para trás. Se mais tarde ou mais cedo teremos cópias da criatividade dos designers preferimos esperar... Talvez já nem seja a falta de informação que nos faça comprar mais e barato. Talvez somente olhemos para o lado e ignoremos as problemáticas sociais e ecológicas que esta indústria e esta forma de consumir produzem. No fim do dia todos queremos ficar com mais dinheiro na carteira... A rapidez que as ferramentas tecnológicas nos permitem partilhar e tomar conhecimento de estilos alheios faz com que a inspiração não pertença às passerelles e às ruas: agora está tudo na Internet.

Como sei, e a directora do curso de Design de Moda da Domus Academy disse, a indústria do vestuário não é o sonho que criámos desde crianças. É fácil ter seis anos e desenhar umas bonecas com roupa colorida, recortar revistas e aprender a fazer modelos para as Barbies. É fácil passar a escola secundária a desenhar croquis mirabolantes e a investir num estilo pessoal. Deixa de ser fácil quando chegamos ao ensino superior e nos começam a cortar as asas. Pode ser difícil de acreditar e de engolir, mas não, não vamos todos ser o próximo  Margiela ou McQueen. Não vamos ter todos uma marca de nome próprio. Uma das razões, talvez a principal, é que nos dias de hoje ninguém precisa de mais um génio. Precisam de alguém que cumpra as tarefas de design e gestão de produto, que corresponda às necessidades da companhia, que tem de alimentar clientes reais num mercado real. Somos designers/gestores anónimos. Não temos rosto, não temos nome... não temos identidade. Quem constrói as marcas são os operários, desapegados dos seus egos, das suas individualidades, com muita vontade de entrega e espírito de equipa. Assim vemos desconhecidos a chegarem ao topo das marcas, como na Gucci que contratou para director criativo Alessandro Michele. O designer já fazia parte da equipa num cargo de assistente. Tem desenvolvido colecções com inspiração retro mas que arrancam corações e se tornam bastante comerciais. O mesmo acontece com Maria Grazia Chiuri e Pierpaolo Piccioli na Valentino. Mas será que também chegará o dia em que, por qualquer razão, serão despedidos? Ninguém está a salvo e se até os génios perdem o emprego, o que será de nós?

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