Desculpe, Senhor Cristóbal...

Nascido no final do século XIX, o Senhor Cristóbal Balenciaga rendeu-se à alfaiataria e depressa se tornou um dos nomes favoritos da alta sociedade espanhola e francesa. Foi mestre de Hubert Givency, Oscar de la Renta e André Courrèges, designers que marcaram a história da Moda. Trabalhava sobretudo haute couture no feminino e após a sua morte, a marca teve um hiatus de quase 20 anos, surgindo Michel Goma enquanto director criativo, seguido de Josephus Thimister. Em 1997 Nicolas Ghésquiere assumia a pasta durante 15 anos, num caminho de altos e baixos que acabaria com a tomada de posse do jovem criativo Alexander Wang. Este injectou muita modernidade à marca, fazendo-nos bater palmas a cada têxtil super interessante e assimilar a estética mais sporty que ia um pouco ao desencontro dos cânones do fundador, mas dava a mão a uma tendência global. A revolução, a meu ver, começou aqui, mas ainda assim nada fazia prever ventos tão fortes. Wang acabaria por trabalhar ali somente três anos, entrando em cena Demna Gvasalia, antigo estudante da consagrada Royal Academy of Fine Arts, na Antuérpia. A transição da estética do jovem designer belga, para a Casa Balenciaga tem sido brusca e nada discreta.

1950 VS 2017

Aposto que o Senhor Cristóbal está às voltas no caixão pois é triste ver reminiscências aos sacos IKEA (que usamos com 0 glamour, para levar compras e fazer mudanças) nas prateleiras da Balenciaga. É desolador ver quem agora assina estas etiquetas, estação a estação, interpretar demasiado conceptualmente o arquivo, como um aluno rebelde que não quer dar a resposta certa ao professor. O processo criativo nas grandes marcas é este, revê-se o espólio para beber inspiração e misturamo-la com aquilo que pessoalmente nos move enquanto artistas. Tem de ser esta a fórmula quando se trabalha para uma Casa centenária: re-iventar a marca sem apagar as suas pegadas na história. Demna Gvasalia desapareceu com a imagem que nos fazia rapidamente acertar o nome "Balenciaga" num jogo de memória, criando outra que se tem tornado numa linguagem popular, que a nova geração aspira dominar.


1952 VS 2016

Não me levem a mal, até porque considero a expressão artística do designer muito interessante e diferenciada daquilo que tem estado vigente enquanto cool e actual. Muitos acharam-no um génio, outros um copiador de desenhos já vistos e estéticas já abordadas (Margiela será o exemplo mais evidente). Fiquei sempre no limbo e a minha opinião inseria-se mais na admiração pela coragem de apresentar looks tão descoordenados da cena da Moda, tão reais, tão vizinho do lado. Apreciei a sua audácia em nos chamar a atenção e fazer-nos esquecer o normcore até aqui conhecido, para apreciarmos a real normatividade dos dias, materializada no corpo dos manequins.  Gostaria de continuar a presenciar estes actos artísticos, happenings em que estranhamos para depois entranhar... mas na Vetements, criação dos irmãos Demna e Guram. Porém ao que tudo indica, a marca não vai mais apresentar as colecções em desfiles convencionais, mesmo que nunca o tenham sido... Dão o cansaço, resultado de um sistema demasiado veloz, como desculpa. Ao mesmo tempo, Demna, canaliza a mesma criatividade para a Balenciaga, mas com uma diferença - aqui é financiada pelo grupo Kering e, supostamente, não tem liberdade total de criação. Neste momento, vejo a Balenciaga como uma continuação mais velha, madura e rica da Vetements. É esta separação tão diluída que me incomoda.



Se a Moda está tão veloz como um simples clique continua, portanto, a viver da novidade. Gvasalia repete-se sob a alçada de duas etiquetas diferentes, dando-nos mais do mesmo. Se esta estética já foi super fresca, hoje é demasiado comum, devido ao próprio designer e a tantos copy-paste que se têm feito (em outras marcas, estilo próprio/streetstyle). Todos ajudaram a esgotar a imagem effortless, desalinhada, irónica e prática mas no fim do dia o método parece estar a resultar na marca de origem espanhola, antigamente tão sofisticada. Mas até quando?

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